quarta-feira, 14 de outubro de 2015
Empresas avaliam até perfil psicológico e valores pessoais para filtrar candidatos.
Já não bastam cinco anos de experiência e inglês fluente no currículo: para acertar na escolha, os processos seletivos passaram a traçar também o perfil psicológico e até os valores pessoais dos profissionais por meio de testes e dinâmicas em grupo.
Quem se cadastra no 99jobs, que faz seleções para Microsoft e Votorantim, responde a perguntas como “Qual o seu carro dos sonhos?” e “O que você faria se ganhasse R$ 20 milhões?”.
Guilherme Hashimoto, 25, trainee da Whirlpool (dona das marcas Brastemp, Consul e KitchenAid) acredita que o teste de valores foi o que o levou a ser selecionado pela organização e eliminado da disputa de outro processo do qual participava.
Apesar da “reprovação” em uma das seleções, ele defende esse tipo de exame, porque não faz sentido trabalhar em uma empresa que não tem a ver com sua personalidade, afirma.
Filtro
Cerca de 7.500 pessoas se inscreveram no último processo seletivo da Microsoft organizado pela 99jobs. Para filtrar os candidatos, a primeira peneira aplicada não foi uma avaliação dos conhecimentos técnicos, como lógica ou idiomas, mas sim de compatibilidade de valores.
Se um candidato não se enquadrava no perfil de pessoas que gostam de interagir com clientes, ele provavelmente não passou pelo funil, exemplifica Eduardo Migliano, presidente da 99jobs.
Entender o comportamento do profissional é hoje uma prioridade das empresas, e em alguns casos chega a ter mais peso na seleção do que uma boa faculdade no currículo.
“As pessoas são demitidas por falta de habilidade comportamental, não técnica”, afirma Roseluci Mafia, professora de MBA em gestão de pessoas do Ibmec-MG.
Na empresa de recrutamento de executivos Talenses, o principal instrumento de avaliação de comportamento é o teste Disc (dominância, influência, estabilidade e conformidade). O formato é simples: diante de uma situação descrita, o candidato responde se concorda ou discorda.
O resultado é um mapa dos pontos fracos e fortes do avaliado: ele exerce bem liderança, mas se atenta pouco às regras, exemplifica Gabriel Almeida, da Talenses.
Mas mesmo os testes cognitivos, como os de lógica e de idioma, estão sendo repaginados. Manuela Silva, 24, conta que o exercício de inglês para ingressar na Votorantim foi enviar um vídeo pelo aplicativo de mensagens WhatsApp.
Interpretação
Outro exame utilizado pela Talenses é o MBTI (Tipologia de Myers-Briggs) para definir o perfil psicológico do profissional. A aplicação é terceirizada pela consultoria Fellipelli, que conta com mais dez testes do tipo em seu catálogo. O preço varia de R$ 50 a R$ 500 por prova.
Segundo Adriana Fellipelli, presidente do negócio, todas as avaliações possuem embasamento científico, e por isso têm a vantagem de serem mais objetivas do que uma entrevista pessoal, que pode ser influenciada por fatores como empatia, por exemplo.
A professora Mafia, porém, discorda que a subjetividade possa ser eliminada, porque os resultados da avaliação ainda precisam de interpretação. “Um perigo que vemos no mercado são pessoas sem preparo para fazer uma análise consistente, e acabam com uma leitura rasa.”
Na consultoria de recrutamento Page Personnel, a avaliação comportamental é acompanhada por entrevista pessoal e checagem de referências. “O teste ajuda, mas não é tudo”, diz Ricardo Haag, diretor da empresa.
A professora de psicologia Acácia dos Santos, editora da revista “Avaliação Psicológica”, diz que muitos testes são importados e usados no Brasil sem validação pelo Conselho Federal de Psicologia. “Quando começamos a registrá-los no conselho, dos cem pedidos que recebemos, aprovamos apenas 30″, afirma.
Segundo Santos, o problema de um exame importado é que ele trabalha com conceitos como “liderança” que são definidos de modo diferente em cada cultura. Sem validação, não há garantia de que eles sejam compatíveis com os brasileiros, o que distorce o resultado.
Dinâmica
As atividades em grupo estão entre as mais temidas por quem participa de um processo seletivo. Com a primeira fase de testes on-line, à distância, acaba sendo na famigerada dinâmica o momento de se provar aos olhos de avaliadores e concorrentes.
Mônica Böhme, presidente da Sociedade Brasileira de Dinâmica dos Grupos, explica que o método evoluiu de uma abordagem maniqueísta (os avaliadores aprovavam quem se comportava como eles esperavam) para uma leitura de perfil: como essa pessoa se coloca? Ela se impõe sobre os outros, interrompe? Como ela negocia?
Essas respostas servem tanto para traçar a personalidade do profissional como para confirmar o resultado dos testes de comportamento, aplicados a distância.
Entre as atividades mais comuns usadas em dinâmicas, destacam-se os estudos de caso, em que um problema relacionado ao negócio da empresa é apresentado para ser discutido em grupo. Assim, avalia-se tanto o conhecimento do profissional sobre o tema como sua postura, explica Böhme.
Tarefas mais lúdicas, como jogos de tabuleiro, também têm despertado o interesse dos empregadores.
Na seleção para o programa de trainee de 2014 da Votorantim, os candidatos tiveram que brincar com Lego.
A avaliação levou em conta quanto cada um se preocupou em ajudar um colega com uma peça que faltava, ou como negociou para obter algo que faltava para ele, diz Manuela Silva, 24, que participou da atividade e hoje é uma das coordenadoras do programa de treinamento.
Já Hashimoto resolveu inovar por conta própria. Na última etapa da disputa por uma vaga de trainee na Whirlpool, a empresa pediu a todos os concorrentes que fizessem uma apresentação de três minutos sobre si.
Em vez de exibir slides, como era esperado, ele usou camisetas, para mostrar como “vestia a camisa” do que acreditava: foi colocando, uma por cima da outra, uniformes da escola, intercâmbio, atlética da faculdade, até chegar na Whirlpool. Foi aprovado.
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>> Testes ao longo do tempo
Teste de QI (quociente de inteligência) Stanford-Binet
Primeiro teste de inteligência do mundo, criado em 1905, foi popular nas décadas de 1910 e 1920
Escala de Inteligência Wechsler para Adultos
Criado em 1936, avalia inteligência, compreensão verbal e velocidade de processamento de informações
Psicodiagnóstico Miocinético (PMK)
Desenvolvido em 1949 para avaliar agressividade com base na reação involuntária dos músculos; usado até hoje entre quem trabalha com armas de fogo
Teste Palográfico
De 1970, analisa literalmente os traços do candidato (riscos paralelos desenhados em um papel); é uma das atividades do exame psicotécnico do Detran
Matrizes Progressivas de Raven
Popular nos anos 1980 e 1990, o teste mostra figuras (como triângulos) organizadas de modo lógico; o candidato precisa entender o padrão e acertar a sequência
G-36
Os exercícios são baseados em grupos de imagens (como de animais), em que o avaliado precisa identificar a exceção entre eles; também popular nos anos 1980
MBTI (Tipologia de Myers-Briggs)
Popular hoje em dia, identifica perfis segundo a teoria do psiquiatra Carl Jung; o resultado define o avaliado como “diplomático” ou “introvertido”
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>> Algumas dos temas abordados no teste da 99jobs e possíveis respostas
Carro dos sonhos?
“Prefiro andar de bicicleta”
“Uma Ferrari”
Destino de férias?
“Prefiro acampar na praia”
“Em resort cinco estrelas”
Opinião alheia?
“É uma perda de tempo levar em conta a opinião dos outros”
“É uma necessidade ouvir o que outros têm a dizer”
Meio ambiente?
“Sou preocupado, mas não contribuo muito”
“Faço minha parte e estimulo os outros a contribuírem também”
Cuidar da saúde?
“Importante, mas não é minha prioridade agora”
“É muito importante e sempre será uma prioridade”
Protesto político?
“Acompanho pela TV ou pela internet”
“Vou pra rua pintado e convido mais gente para ir também”
Salto de pára-quedas?
“Não gosto de esportes radicais”
“Quando é o salto? Bora!”
Fonte: Folha de São Paulo, por Fernanda Perrin, 11.10.2015
sábado, 3 de outubro de 2015
eSocial exige mudança de filosofia.
A obrigatoriedade para o eSocial vem se aproximando e, a partir de setembro de 2016, as empresas com faturamento superior a 78 milhões de reais no ano de 2014 já deverão estar 100% adequadas aos novos procedimentos. Para as demais, o prazo para adequação é janeiro de 2017.
Faltando cerca de um ano para o eSocial entrar em vigor, a iniciativa do Fisco foi amplamente debatida no mercado corporativo, mas será que entendemos a principal mudança que a nova regra trará para os departamentos de Recursos Humanos? Talvez não.
O eSocial não trouxe nem trará nenhuma mudança na legislação trabalhista e previdenciária, nem novos tipos de encargos ou impostos. A novidade da regra é que as empresas terão que reportar essas informações para o Fisco, dentro do rigor e de prazos estipulados pelo Governo. Assim, todos os processos de atividades ligadas ao RH, como folha de pagamento, admissão ou demissão do funcionário, dados sobre medicina e segurança do trabalho, férias, afastamentos, etc. terão que estar parametrizados de acordo com o eSocial para serem transmitidos.
Hoje, a maioria das empresas já cumpre suas obrigações trabalhistas, porém cada uma tem seu modo de operação, muitas vezes realizando processos de forma incompleta ou indevida, ou ainda não respeitando prazos. Com o eSocial, não haverá mais espaço para essa flexibilização.
Mais do que qualquer outra coisa, o que o eSocial vai exigir das companhias é uma mudança de cultura e paradigma para “arrumar a casa”, no que se refere aos processos do RH, tendo em vista que em média 49% dos processos precisam ser alterados ou adaptados para aderência ao eSocial. Isso não se faz de um dia para outro, portanto, é urgente que as empresas que ainda não estão considerando a revisão de seus processos de RH comecem o quanto antes.
Mudar hábitos enraizados de todo um RH leva tempo. Cabe ao responsável pela implantação do eSocial na empresa mostrar aos envolvidos a importância dos prazos estabelecidos e de como será importante trabalhador e empregador estarem atentos não só aos documentos há décadas exigidos pelo governo, mas sim aos prazos. Um bom exemplo são os exames admissionais: algumas vezes, em comum acordo entre empresa e empregado, o exame é deixado para depois da contratação, ou seja, o processo acaba sendo feito, mas sem obedecer a legislação, que determina que o referido exame deve ser realizado antes do início das atividades do empregado na empresa.
A partir da entrada em vigor do eSocial, as companhias terão que estar preparadas para acompanhar todos os processos trabalhistas, dando a estes começo, meio e fim, entendendo que o prazo faz parte da regra fundamental. E vale lembrar, sai na frente quem investir em formação e capacitação de pessoas, para que estas possam incorporar a nova ideologia de fiscalização do governo, e preparo e adaptação dos sistemas para o eSocial, tendo em vista que 69% das empresas não possuem sistema de SESMT e os demais sistemas que servirão de base de informações ainda não encontram-se totalmente adequados.
Após todo o debate sobre o eSocial, percebemos que esta é uma regra que vem para melhorar o sistema trabalhista brasileiro, e não só para onerar o empresariado do país. Apesar de não fazer nenhuma alteração na legislação trabalhista atual, que necessita de muitos ajustes e uma modernização urgente, o eSocial é uma forma de fazer valer as regras, unificar e facilitar a entrega de documentos por parte das empresas, além de permitir ao Governo um maior controle e fiscalização sobre os documentos, já que estes vão ganhar uma forma de “publicidade” nunca feita no Brasil anteriormente.
Fonte: Relações do Trabalho, por Danilo Miranda e Juliana Carvalho, 02.10.2015
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